Aprender a aprender – Realmente vale a pena?

Aqui estamos, um pouco atrasados, mas com mais uma, espero, boa discussão: aprender a aprender – isso realmente vale a pena ou será que é só mais um “teoria louca criada por profissionais da área de educação e que não é realmente aplicável ou útil na prática”? Bem, apertem os cintos, abram suas mentes e vamos lá! 🙂

A origem do “Aprender a Aprender”

Comecemos então a pensar o significado dessa expressão, tão simples mas ao mesmo tempo profunda no que diz respeito a atacar um dos maiores problemas que atingem nossos alunos e que os dificulta a aprender. O que realmente significa “aprender a aprender”?

Uma vez que desde jovem eu aprendia tudo muito facilmente, sempre outros alunos perguntavam-me: o que você faz para aprender tudo tão rápido? Na época eu pensava “ué, nada!”. E isso começou a incitar-me uma dúvida: se nada estou fazendo de especial para aprender mais rápido (ou, assim digamos, realmente aprender), o que está atrapalhando os demais, o que eles “estão fazendo” para facilitar o aprendizado?

Com o tempo, claro, comecei a perceber que o problema estava na forma como cada um de nós estudava, abordava o objeto epistêmico (aprendi esta expressão com prof. Schneider na universidade ! 🙂 ). Sendo assim, era o tipo de “abordagem” que deveria mudar antes de querer aprender algo.

Somente em início de 2006, quando estava a escrever a minha monografia de graduação, foi que eu comecei a juntar mais peças deste quebra-cabeças: apesar de cursar Ciência da Computação e ser apaixonado por programação, o Destino acabou por levar-me a escrever uma monografia sobre o emprego de jogos na educação, onde comecei a ler muitos livros e artigos da área de educação.

E um dos artigos que li foi um documento escrito por Jacques Delors intitulado “Os quatro pilares da educação”, publicado no livro “Educação: um tesouro a descobrir”, da Editora Cortez, São Paulo, 1999.

Até aí, aparentemente, nada demais, exceto pelo fato de que os quatro pilares são: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. De forma bem simples, os quatro pilares tratam sobre as várias formas de aprendizado que devemos ter em nossas vidas.

O primeiro fala sobre a importância de sabermos como aprender antes de querer aprender um determinado assunto/tarefa, caso contrário o aprendizado deste será inócuo, uma vez que muito provavelmente não haverá aprendizado.

O segundo fala sobre a necessidade não somente de saber “como funciona na teoria”, mas na prática, exercitando, construindo, realizando. O aprender por aprender não parece muito útil, exceto quando ele consegue gerar algum fruto real que nos traga benefícios, concorda? 🙂

O terceiro fala sobre como precisamos redescobrir nosso convívio social a fim de que aquilo que aprendamos seja útil não somente para nós, mas no meio em que nos inserimos. Desta forma, aprendo as tarefas necessárias para que eu possa ser útil na sociedade em que vivo, fazendo a minha parte para o bem-estar coletivo.

E, por fim, o quarto pilar, o aprender a ser, ou seja, somente após aprendermos a aprender, a fazer e a conviver é que podemos realmente definir nossa identidade em nosso meio, saber quem somos.

A ordem dos pilares é a mesma ordem em que cada mudança deveria ocorrer, sendo assim, estamos bastante atrasados na luta, já que o “aprender a aprender”, infelizmente, ainda não é uma realidade. 🙁

Por que ainda não “aprendemos a aprender”?

Na verdade, alguns de nós já começaram a aprender a aprender, o problema é que, de alguma forma, tal conhecimento ainda é bastante tácito e restrito a alguns poucos.

Para que tal aprendizado comece a ser realmente disseminado, acredito que estão faltando recursos, reforma no modelo educacional vigente e conscientização de todos os envolvidos nesse processo.

Jacques Delors aponta-nos as necessidades, mas não diz exatamente como deve ser erguido cada pilar. Coube a diversos outros pesquisadores definir como deveria ser feita cada etapa.

Quanto ao aprender a aprender, acredito que é muito complicado alcançar tal tarefa com os poucos recursos que há hoje: os professores muitas vezes ainda lidam com somente o quadro-negro (ou, no máximo, o quadro-branco) para melhor “exibir aquilo que quer ensinar”. Sem melhor uso de recursos multimídia que possam facilitar o aprendizado (é do conhecimento de todos que aquilo que é visualizado e ouvido, e assim sendo “vivenciado” mesmo que de forma muito artificial, é melhor fixado em nossa memória do que aquilo que é somente lido), como conseguir falar de aprender como se deve aprender?

Cabe então às autoridades competentes ajudar por meio da introdução de capital e meios suficientes para agilizar a aquisição de recursos que auxiliem não somente o aprendizado dos alunos, como também a capacitação e execução das atividades dos professores.

E por falar em capacitação, isso lembra-me que supracitei a necessidade de uma reforma no modelo educacional e o motivo é muitos simples: ainda hoje encontramos diversos professores e outros profissionais envolvidos com a educação que “torcem o nariz” quando se fala em mudar o paradigma instrucionista da educação. É uma pena, pois há muito tempo que os pesquisadores em educação já deram este como um paradigma morto e diversos outros foram propostos, sendo o mais forte o construtivista.

Como conseguir aprender a aprender quando não sabemos nem mesmo como ensinar? Como conseguir atravessar uma ponte a pé quando nem mesmo sabemos caminhar? Sendo assim, a reforma deve ser profunda, não somente na forma como os professores ensinam aos alunos, não somente na formação educacional destes, mas na organização das escolas e demais estruturas de ensino: como favorecer o aprender a aprender nas escolas se as mesmas hoje estão preocupadas única e exclusivamente com a formação (ou “modelagem”) das mentes de nossos alunos para vestibulares? Quanto maior o número de aprovados, maior a visibilidade positiva que a escola tem. Infelizmente, há muito tempo os pais não mais se interessam em saber qual o modelo educacional adotado pela escola.

Percebam que, propositadamente ou não, acabamos por chegar ao terceiro ponto: a necessidade de conscientização de todos os envolvidos da importância do aprender a aprender. Não adiantaria uma única escola remodelar-se para atender ao primeiro pilar hoje, pois muito provavelmente os pais simplesmente prefeririam matricular seus filhos em outra escola “que melhor prepare para o vestibular”, da mesma forma, os alunos muitas vezes “torceriam os narizes”, acostumados a somente terem que decorar trechos de textos ou fórmulas.

Sim, este é um jogo de xadrez complicado, onde mudar a posição somente de uma peça pode não surtir o efeito esperado, e é isso que torna tão mais complicado fazer o aprender a aprender deixar de ser algo tácito, de conhecimento de alguns poucos indivíduos, e passar a ser conhecimento explícito e comum a todas as pessoas.

Mas afinal: aprender a aprender realmente vale a pena?

Algumas pessoas poderiam dizer que o tempo que se leva para “aprender a aprender” acaba por tomar o tempo que poderia ser empregado para se estudar alguma disciplina ou tarefa a fim de empreendê-la mais rapidamente, mas será que tal aprendizado não nos ajudará em tantas outras coisas?

Se permitirem citar-me mais uma vez como exemplo, posso dizer que o “saber como aprender” (vou assim dizer, pois até eu tenho dúvidas de realmente sei o “aprender a aprender”) é muito importante em minha vida – quanto mais aprendo, mais percebo que muito pouco ou nada sei, mas também percebo que mais posso aprender.

Acaba por gerar um círculo vicioso, em que o meu “vício circular”, que alimento o tempo todo, é o conhecimento. “Aprender algo novo nunca é demais”, poderia ser o meu mais novo lema.

Algo que se percebe é que, apesar de preferir este ou aquele tema, todos os assuntos podem ser aprendidos com relativa facilidade, uma vez que não é mais o tipo do assunto que irá especificar o tempo necessário para aprendê-lo, mas sim a extensão e profundidade do mesmo.

Em outras palavras, o aluno que aprende facilmente História ou Biologia mas sente dificuldades em Matemática ou Física ainda não aprendeu realmente a aprender, pois quando se sabe como aprender, pode-se empregar tal conhecimento na arte de aprender qualquer tipo de conteúdo, independente de qual a “categorização” que lhe é atribuída pela escola.

Aliás, por promover um aprendizado muito mais integrado e que facilite compreender como cada assunto pode interferir em nosso cotidiano, o aprender a aprender acaba por unir todos os conteúdos que, outrora, eram apresentados de forma tão pulverizada. Passa-se a estudar os conteúdos de História integrados aos de Geografia, que com certeza nos levará a muitos conteúdos de Biologia, uma vez que os avanços em pesquisas biológicas se fazem presentes na cronologia do nosso mundo, da mesma forma que o estudo de Línguas mostrará o seu papel de importância, com as modificações que a mesma sofrera ao longo dos tempos.

Bem, se em tão poucas palavras e em alguns segundos conseguimos integrar tantos conteúdos, o que podemos dizer a respeito de quão benéfico seria para os nossos alunos se os tantos anos que passam na educação fundamental, média e superior também fosse feita de forma tão integrada, sempre procurando demonstrar a importância do aprender e o papel que cada conteúdo possui num contexto mais global? Sob minha perspectiva, os benefícios seriam incomensuráveis.

E o que pode ser feito para incentivar o aprender a aprender?

Com certeza não sou eu o mais indicado a responder essa pergunta, mas, já que estamos aqui, por que não tentar?

Como citei anteriormente, um dos grandes problemas no “aprender” hoje é o fato de muitas vezes o aluno não saber como empregar o novo conceito em seu cotidiano. Se eu não sei a importância de algo, por que me dar ao trabalho de aprender? Desta forma o “aprender a aprender” deve se preocupar primeiro em apontar ao aluno a importância de descobrir como aplicar tais novos conceitos. Ensiná-lo a explorar o novo assunto de forma a tornar intuitivo compreender como ele se encaixa e é importante em seu dia-a-dia.

Tomemos como exemplo o estudo de História, mais especificamente, das civilizações que viveram na Mesopotâmia. Algo tão distante e há muito tempo “morto”, em que isso pode me ser importante??? Bem, lembre-se que as civilizações antigas não estavam isoladas – estudamos a civilização egípcia, greca, romana, persa, etc. Percebemos quão importante era para cada uma delas seus sistemas agrícola e o comércio com as demais e com o crescimento de cada uma delas, surgiu a necessidade de “dominar as demais”, dando início a fases imperialistas, como colonizações e fusões de muitas civilizações. Tantas modificações levaram a começar a moldar vários dos traços de como são as civilizações que lá residem até hoje, o que demonstra as diferenças culturais que há entre vários povos hoje, como brasileiros, árabes, americanos, espanhóis e japoneses – cada qual teve um desenvolvimento cultural diferente, explicado a partir das civilizações-berço e das interações com as demais. Perceba que eu não quero estudar a “Mesopotâmia por ser a Mesopotâmia”, mas para compreender o papel que ela teve em mudanças a outras civilizações, bem como para compreender quais traços que ainda hoje se mantêm daquela cultura, bem como quais foram erradicados. Só saber que a Mesopotâmia já existiu não basta – é necessário saber por que está estudando a Mesopotâmia!

Da mesma forma, estudar Matemática sem saber quando irá empregar tais conteúdos programáticos pode ser muito tedioso. Por exemplo, Trigonometria – quer algo mais cheio de fórmulas e “chato”? Bem, posso concordar com o “cheio de fórmulas”, mas não com o “chato” – se você estudar realmente a Trigonometria perceberá que ela pode ajudá-lo a definir diversas informações no plano ou no espaço. Como desenvolvedor de jogos, por exemplo, emprego muitas fórmulas trigonométricas na definição de movimentações de objetos e personagens em meus jogos. Se você pegar qualquer tipo de jogo, há uma boa chance de que haja alguma fórmula trigonométrica no mesmo e, com certeza, sempre há cálculos matemáticos a serem feitos lá. A Matemática passa a se tornar interessante, quando você descobre que as fórmulas de juros simples e compostos que você aprende na escola não são somente para decorarmos e que elas podem realmente fazer a diferença no seu dia-a-dia, quando você poderá empregar para determinar se uma comprar ou investimento é realmente interessante ou não (e pode acreditar, posso falar disso, pois há pouco tempo fundei o Clube do Dinheiro 🙂 ).

O segundo empecilho que o aluno deve “derrubar” é o “aprender cada coisa como uma peça separada” e passar a “aprender cada coisa como uma peça de um grande quebra-cabeça, conhecendo sua relação com as demais”. Em outras palavras, primeiro nós precisamos explorar e, agora, precisamos aprender a conectar.

Como falamos anteriormente, tão maravilhoso pode ser o aprendizado quando paramos de dividir cada coisa que aprendemos como se pertencente a uma única categoria, como Matemática, Física e Língua Inglesa, e passamos a compreender como ele se relaciona com todos os demais assuntos, mesmo aqueles que pertencem a uma “outra categoria”.

O aluno que aprende como os assuntos vistos em História levam aos fatos conhecidos na Geografia compreende melhor porque a guerra entre israelenses e palestinos até hoje não foi cessada. Da mesma forma, compreende-se porque os Estados Unidos desenvolveram-se tanto a ponto de tornarem-se uma potência mundial enquanto que o Brasil, país também das Américas, está longe de atingir tal patamar. Ambos foram colônias, não? Mas um estudante mais atento perceberá que os EUA foram colônias de povoação, enquanto que nós fomos de exploração. Além disso, durante a I Guerra Mundial, com a Europa em guerra, os Estados Unidos passaram a ser provedor de mantimentos e exportador de muitos equipamentos, em outras palavras, sua indústria cresceu muito mais rapidamente. Com o fim da guerra, as antigas potências européias estavam enfraquecidas e os Estados Unidos fortalecidos.

Quão magnífico pode ser o aprendizado quando a informação que aprendemos não se trata somente de um “texto ou fórmula a ser decorado”, mas sim de algo que pode nos ajudar a compreender o mundo como ele é!

Então estudante, se você está interessado em aprender a aprender (ou você professor está aqui, curioso por saber como pode “experimentar essa novidade” com seus alunos), busque primeiro explorar e conectar cada novo conhecimento. “Mais vale um conhecimento realmente aprendido, do que duas informações decoradas (que partirão logo, logo) voando“. Este deveria ser nosso novo ditado.

E se você ficou curioso se realmente eu lembrava do que comentara acima ou se precisei consultar algum daqueles livros, como já disse, eu os aprendi e o que realmente aprendemos, não esquecemos jamais.

Experimente aprender a aprender, tenho certeza de que você terá muito mais a ganhar do que a perder (eu, por sinal, estou hoje muito interessado em aprender sobre Nutrição, Negócios e Investimentos 🙂 ).

Ah, e sim, aprender a aprender realmente vale a pena!

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